Os monstros da percepção me acolhem, ninam-me com uma obscura canção, cuja melodia foi roubada do escuro labirinto das desilusões. Somos frascos transbordando veneno e percorremos ruas, poluindo calçadas e almas, disseminando esperanças com o sutil grito de dor. E fingimos, a cada instante, que conseguimos suportar as máscaras e o peso nos ombros, mas a coluna é frágil. Vivemos mancos, multiplicando a gordura do corpo flácido, e sucintamente congeminando o desdém. Então nada sobra, além do monstruoso arrepio dos tecidos que encobrem a carne humana; o feitio de encontrar um outro corpo-chave para rasgar esta mesma carne que se esconde sob os tecidos e dilacerar as vísceras. O que não se pode evitar, ao ouvir passos mancos a pestanejarem falsas relações impróprias entre um caminho e outro, é o dom inefável da múltipla percepção. O poder de aflorar a relação consigo e para com o outro... Andamos todos frágeis, nos sustentando sob mentiras e/ou esperanças, prosseguindo devido a lembranças de muitas faces e não sabemos sequer o momento de retirar a máscara de ferro que nos pesa e prende como não sei o quê, que impede o grito tenebroso de ecoar pelo universo "vazio".
Os Monstros do Enxergar me entendem. A tal máscara de ferro, inquebrável, cuja ela mesma é a causa de lágrimas inacabáveis, prantos inconsoláveis, não se faz satisfeita ao me sugar o último sopro de liberdade. Tal máscara já me fez amar, mas Que é o amor quando não se tem por verdadeiro? Que são todas as chances de vitória e os troféus acumulados, quando não se pode reconhecer a si mesmo?
Somos vazios ambulantes entupidos de medo, e é este o pior veneno. O que facilmente contamina. A cada passo, enviamos uma alma para o céu, esta, ingênua, parte sem saber reconhecer a si ou aos outros. Esta pobre alma liberta aos céus, toma o Paraíso sem saber o sentido em ser mais um na multidão que o habita entre preces e máscaras.
Será, o nosso medo, o que impede ou o que nos facilita a passagem ao Paraíso?