terça-feira, 7 de maio de 2013

Labirinto de meus sonhos inócuos

Te vi virar a esquina, passar pela porta da casa de número treze com o olhar desconexo de sempre e o sorriso que quase sempre não existe ou é forçado. Vi-te caminhar por mais dez ruas, cruzar caminhos que eu nunca imaginei que pudessem ser passados tantas repetidas vezes e mesmo assim não se cansou. Foi efêmero o sentimento que me ocorreu quando uma moto quase te atropelou e você sequer desdenhou do moço de capacete cor de rosa... Vi que a tua camisa vermelha tinha cheiro de chuva e contrastava muitíssimo bem com o céu cinzento que acontece uma vez a cada década ou mais. Você finalmente parou, sentou num banco qualquer ao meio de um dos caminhos que seguiu sem rumo e permaneceu calado. Porém, os teus olhos pensantes me contaram, até quando fechados, as mil e uma desventuras passadas nesse caminho ou nesses caminhos em que nada, de fato, aconteceu ou nada que valesse à pena lembrar por mais de dez minutos (o tempo que durava a jornada entre uma estrela oculta e outra, vista do meu ângulo). Os protótipos ingênuos de todos os andarilhos e pessoas apressadas pro trabalho ou para a família ou sabe-se lá para onde ou quem, te faziam suspirar e isso também eu via, com meus olhos de engolir dinossauros e destilar utopias. Os passos apertados, alheios, dispersos, você ouvia e sentia-se mal por caminhar descompassado por entre a multidão em que se acomodavam apenas algumas pessoas. Foi o desinteresse com o qual me aproximei das tuas flores sem pétalas que te fez recuar. Mas você nem sentiu. Num amargo sangrento, em que meus olhos choravam saudades reclusas, você também não notou que eu estava te gritando enquanto observava calada o teu trocar de ideias, expôr de opiniões. 
O que houve após essa troca não mútua de inutilidades melancólicas? Nada. O dia acabou-se cinzento e a noite não derramou uma lágrima de orvalho, pois não tinha motivo para deixar transparecer qualquer tipo de afinco ou tristeza, porque, no fim das contas, não havia tristeza. Apenas um apelo iludido por algo que já aconteceu errado. Já começou errado. Nada houve após os passos insonoros; nem uma Guerra entre dois mundos, sequer Estados. A burguesia não caiu. A coca-cola não parou de ser consumida em quase 99% do planeta. Mas deveria. Porque dentro de mim houve terremoto. A temperatura subiu aos 90º C e não houve reação alguma do organismo. A tua biologia, teus cálculos e teorias metódicas não adiantaram ou reforçaram ideia alguma de salvação de meu ser.
Um único pedido oculto. Mas que, acima de tudo, não era pedido... O que eu queria era esse Nada mesmo, mas que viesse ele completo. Repleto do teu Nada que poderia significar uma imensidade de coisas.
Você estava em baixo de uma árvore, sob um céu cinzento e choveu por quase a semana inteira, após dois anos sofridos de seca. Vestia uma camisa vermelha e estava sozinho olhando para onde eu não posso imaginar. Eu já pensei em escrever sobre esse momento mais de um milhão de vezes, inclusive enquanto eu te observava, feito louca psicopata, de sensações incontroláveis, me passavam poesias das mais lindas e fortes. Mas nem tudo se pode descrever com igual exuberância. Nem tudo se traduz ao fundamento português. Há momentos que se passam apenas para serem lembrados numa hora qualquer; que não haja fotografia ou escritura. Para ficar colada numa parte pequena da existência.
Há pessoas, acima desses momentos e lembranças, que existem para serem observadas. Essas, intocáveis, guardam em si quase todos os mistérios da vida, e não há graça se forem eles todos descobertos de uma única vez.

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